Tem razão o ministro da Ciência e Tecnologia, Aloizio
Mercadante, ao conclamar, no discurso de posse, as empresas brasileiras a
investir "muito mais" em inovação.
Enquanto isso não ocorrer, é
retórica esperar que o país supere o nível de uma economia medianamente
industrializada. Esse é o único consenso entre acadêmicos, analistas e
instituições.
Os resultados da Pesquisa de Inovação Tecnológica (Pintec)
referentes a 2008, recentemente divulgados colocaram boas polêmicas na
mesa.
Os resultados da Pintec, divulgados
pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foram
recebidos com decepção ou reservas por alguns analistas. Já o Banco
Nacional para o Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a
Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), principais responsáveis pelo
fomento à inovação no país, viram avanços.
A Pintec 2008 é o retrato
mais recente e completo do estágio em que se encontra o Brasil na área
da inovação.
Apesar de a taxa de inovação na indústria (percentual que representa o
total de indústrias ouvidas dividido pelo total das que disseram ter
introduzido pelo menos uma inovação) ter passado de 33,4% em 2005 para
38,1% em 2008, o economista David Kupfer, professor da Universidade
Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e um dos principais estudiosos da
evolução industrial do país, constatou que quando visto mais de perto,
com lupa, o resultado não é tão auspicioso quanto possa parecer.
Ele constatou que das 100,5 mil indústrias pesquisadas, apenas 4,2%
realizaram atividades internas de pesquisa e desenvolvimento em 2008,
ante 5,6% na Pintec de 2005. O dado é o principal indicador do esforço
inovativo feito pelas empresas industriais. "Eu gosto de ver mais as
variáveis de esforço do que de resultado", disse Kupfer. Ressalvando a
necessidade de que seja feito um mergulho mais profundo nos números da
Pintec, ele alinhou outros dados que, na sua opinião, corroboram sua
relativa decepção.
Outros dados
Sempre comparando 2008 com 2005, os gastos da indústria de transformação
com pesquisa e desenvolvimento (P&D) caíram de 2,8% para 2,6% do
faturamento. A proporção de pessoas ligadas a atividades de P&D em
relação ao pessoal total caiu de 0,80% para 0,69%, e o número de mestres
e doutores aumentou apenas de 4.280 para 4.340 em três anos.
De acordo com o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), a Pintec
mostrou um crescimento de 10%, com o total dos gastos empresariais na
área passando de 0,49% para 0,54% do PIB. Analistas do Ipea compararam o
avanço brasileiro com o de outros países e concluíram que o esforço
brasileiro, embora expressivo, está sendo muito pequeno quando
considerada a necessidade que o país tem de investir para reduzir o
fosso tecnológico entre ele e os países que estão na fronteira
tecnológica.
Os 10% de avanço brasileiro em relação a 2005 foram inferiores aos 12%
dos Estados Unidos, aos 21% da China, aos 23% da Espanha, e aos
incríveis 145% de Portugal, onde a taxa de investimento das empresas em
P&D passou de 0,31% para 0,76% do PIB. Com base nos dados
analisados, os técnicos do Ipea calculam que aumentando os investimentos
no ritmo atual o Brasil precisaria de 20 anos para chegar aos níveis
europeus.
Para Kupfer, a decepção veio também por conta da falta de resultados
mais expressivos em um período no qual a economia brasileira cresceu em
ritmo mais acelerado. De 2006 a 2008 o PIB brasileiro expandiu-se a uma
média anual de 5,1%. "Parece que a indústria brasileira não investe em
inovação na fase ruim porque está ruim e também não investe na fartura
porque está farto", provocou.
9 mil empresas a mais
Já o presidente da Finep, Luis Fernandes, considera que o economista
David Kupfer está "excessivamente pessimista, inclusive com os dados".
Ele disse que a próprio crescimento da taxa de inovação na indústria
para 38,1% "não é desprezível", considerando que essa taxa "estava
estagnada na casa dos 33% até 2005". "São 9 mil empresas a mais que
inovaram", ressalta.
Fernandes destacou também, no que toca ao esforço de pesquisa, o aumento
de 0,57% para 0,62% do percentual do faturamento das indústrias
destinado a pesquisa e desenvolvimento (P&D). Outro dado positivo
destacado pelo dirigente da principal agência de fomento à pesquisa
tecnológica do Brasil foi o fato de ter passado de 18,8% para 22,3% o
percentual de empresas inovadoras que utilizaram pelo menos um mecanismo
de apoio governamental.
Fernandes resume assim o quadro que viu dos números da Pintec:
"Precisamos melhorar muito, mas ficamos satisfeitos em ver uma evolução
na direção correta". O presidente da Finep também ponderou os efeitos da
crise econômica mundial cujos impactos começaram a ser sentidos em 2008
para explicar retração dos investimentos privados em inovação.
Também o BNDES, que nos últimos anos aumentou muito sua participação nos
mecanismos de apoio estatal à inovação, considera que a leitura da
Pintec feita pelos analistas precisa ser ponderada, mesmo admitindo que
há um longo caminho a percorrer. Para Claudio Leal, superintendente de
planejamento do banco, o período de 2006 a 2008 compreendido pela última
pesquisa do IBGE "não é capaz de captar" os resultados dos diversos
mecanismos de apoio à pesquisa e desenvolvimento e à inovação no Brasil.
Processo positivo
"Estamos com a Finep, há um processo positivo", disse, ressaltando que
esse aspecto positivo existe mesmo quando o avanço é obtido só com a
compra de máquinas e equipamentos mais modernos.
Ele destacou o crescimento do interesse de empresas estrangeiras de
instalarem centros de pesquisas no país, especialmente na área de
petróleo, e o aumento da disponibilidade de financiamento, liberando a
empresa de usar recursos próprios para inovar.
Somente o BNDES possui hoje 15 mecanismos de fomento voltados para a
inovação. No conjunto, eles desembolsaram R$ 563 milhões em 2009, no
total de 156 projetos, saltando para R$ 999 milhões em 217 projetos, de
janeiro a outubro de 2010.
O relatório anual de utilização dos incentivos fiscais da chamada Lei do
Bem (nº 11.196/2005) referente a 2009, recentemente divulgado pelo MCT,
também reflete o clima de otimismo, com ressalvas, existente no governo
quanto aos avanços do país em P&D e inovação.
Nas suas conclusões, o trabalho do MCT também destaca a necessidade de
uma evolução maior. Considerando que o total de empresas beneficiárias
dos incentivos fiscais da Lei do Bem corresponde a 14,5% do total de
empresas que investiram em P&D no Brasil (dados da Pintec 2008), o
ministério diz que "a participação do empresariado brasileiro nos
investimentos em P&D ainda é bastante tímida".
Direção certa, caminho longo
"Essa situação não é compatível com o atual sistema de educação e de
ciência e tecnologia do Brasil, o que tem provocado um descompasso entre
a tênue geração de inovação das empresas brasileiras e a alta
competência técnico-científica das nossas universidades", diz o
trabalho, corroborando, de certa forma, o economista David Kupfer quando
diz, aplaudindo a Lei do Bem: "Não estamos na direção errada, mas ainda
temos muito que andar".
O economista Antonio Barros de Castro, também professor da UFRJ,
ex-presidente do BNDES, reconhece que entre os estudiosos da temática da
indústria no Brasil "ninguém se entusiasmou" com o resultado da Pintec.
Segundo ele, o mais impressionante é que na 4ª Conferência Nacional de
Ciência e Tecnologia, realizada em maio deste ano, "ficou evidente que o
Brasil vem acumulando forças para um possível desejado ingresso na
economia do conhecimento".
Entre os sinais desses esforços, ele enumerou o aumento da verba do MCT
"de US$ 600 milhões para US$ 2 bilhões em uma década" e a multiplicação
de órgãos, tanto na esfera federal como na estadual e na municipal,
voltados para o incentivo à busca da inovação.
"Sessenta por cento dos gastos com inovação na América Latina vêm do
Brasil", resume Castro, que acrescenta: "Os resultados, porém, são
bastante modestos". Ele acha que o furacão China inibe o apetite
inovador do empresário e sugere, como vem fazendo há muito tempo, que o
Brasil busque adensar as cadeias produtivas em áreas nas quais pode ser
líder, como o petróleo em águas profundas e o etanol.
Da redação, por Luana Bonone, com informações de Chico Santos e Heloísa Magalhães,
do Jornal Valor Econômico
Portal Vermelho - PCdB
6 de Janeiro de 2011 - 11h37
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